Republicanismo (S02E05) – Transcrição

Transcrição do quinto episódio da segunda temporada tratando sobre Filosofia política e publicado no dia 30 de Agosto de 2021. O assunto é Republicanismo.

BLOCO 1

[INÍCIO DO EPISÓDIO]

[FRANK]

O republicanismo nos é mais comum do que se imagina. Além de vivermos em uma república, várias das coisas que realizamos no âmbito político são inspiradas ou feitas tendo tal ideologia em mente: seja a obrigação de votar ou de termos filosofia no ensino médio como forma de promover a formação de cidadãos mais críticos.

O republicanismo tem seus tipos, tem uma forte relação com a liberdade, atende determinadas características e incentiva certos valores – como o patriotismo – e desencoraja ou combate outros valores – como a dominação e a tirania. Mas… o que é o republicanismo?

[SOM DE UMA BATERIA TOCANDO JAZZ SURGINDO AO FUNDO]

Meu nome é Frank Wyllys e este é mais um episódio do Esclarecimento.

[SOM DE UMA BATERIA TOCANDO JAZZ DESAPARECENDO AO FUNDO]

[CURTA PAUSA SILENCIOSA]

BLOCO 2

[MÚSICA SURGINDO AO FUNDO]

[MÚSICA FICANDO COMO SOM DE FUNDO]

[FRANK]

O republicanismo tem ao menos dois significados. O primeiro o considera como um regime político – ou uma teoria de regime político – que é oposto à monarquia. Uma república, portanto, teria o seu governo eleito pelos seus cidadãos. Ou seja: o poder numa república não é herdado, mas recebido por mérito, e deve ser colocado sob vigilância permanente dos seus cidadãos.

O segundo significado de republicanismo foca nas relações que os seus cidadãos estabelecem com os outros na sociedade. Esse foco nas relações se dá na igualdade entre eles e na sua necessária participação nos assuntos da república, pois só assim se garante a liberdade de todos os cidadãos – seja de outros cidadãos ou do próprio governo republicano.

Além desses dois significados, o republicanismo tem algumas características – onde duas delas serão aqui ressaltadas. Uma dessas características seria a defesa do estado livre. Além de unificar as mais variadas visões de república, a vida em um estado livre reforça a posição republicana de ser antitirânica, contrária a toda dominação. É o estado livre, portanto, o que vai possibilitar tanto a grandeza quanto o crescimento da república, assim como a livre busca dos cidadãos pelos seus próprios objetivos.

Uma outra característica do republicanismo é a defesa contínua de certos valores ou virtudes cívicas – vistas como indispensáveis para a conquista da liberdade. A ideia é que uma república enfrentaria melhor os contratempos que nela surgirem ao ser populada por cidadãos que contenham essas virtudes ou valores. E quais seriam esses valores ou virtudes? Bom: temos a coragem, a prudência, a igualdade, a simplicidade, a honestidade, a benevolência, a moderação, o patriotismo, a integridade, a sobriedade, a abnegação, a laboriosidade, o amor à justiça, a generosidade, a nobreza, a solidariedade e muitos outros mais.

Vale destacar que os republicanos, em oposição aos valores e virtudes citados, contrapuseram uma lista de males sociais e vícios de conduta. Nessa lista eles repudiam a ambição, a avareza, o orgulho, o egoísmo, a prodigalidade, a ostentação, o refinamento, o cinismo, a covardia, a extravagância, o luxo e muitos outros mais. O republicanismo, portanto, carrega não somente fortes exigências aos cidadãos como também grandes riscos para a vida comum caso tais exigências não sejam satisfeitas.

[MÚSICA DESAPARECENDO AO FUNDO]

[CURTA PAUSA SILENCIOSA]

BLOCO 3

[MÚSICA SURGINDO AO FUNDO]

[MÚSICA FICANDO COMO SOM DE FUNDO]

[FRANK]

O republicanismo, em sua rejeição da dominação e da tirania, reivindica uma ideia vigorosa de liberdade. Ora: essa liberdade precisa, para sua preservação, da virtude dos cidadãos; e essa virtude, por sua vez, necessita de certas precondições políticas e econômicas. Que precondições são essas? São a existência de instituições básicas da sociedade sob pleno controle dos cidadãos determinando o modo como se organiza o sistema de governo e o modo como se regula a economia. Um bom governo, portanto, devia contribuir para manter e desenvolver essas precondições e apoiar a presença de cidadãos virtuosos, politicamente ativos.

Para assegurar a sua não-dominação, os republicanos buscaram ferramentas capazes tanto de facilitar o controle dos cidadãos sobre seus representantes quanto, ao mesmo tempo, de tomar possível uma expressão mais plena deles. Com essas instituições destinadas a assegurar a independência dos cidadãos – e a diminuir, assim, os riscos de abuso por parte dos governantes -, os republicanos tenderam a defender uma organização institucional que incentivasse a discussão pública em torno do bem comum, um objetivo que podia ser alcançado tanto por meio do sistema educacional como por meio do próprio sistema político. A discussão sobre o bem comum era vista, em suma, como uma forma de servir ao autogoverno – de dar voz à cidadania sobre o modo de organização de sua comunidade.

Para o republicanismo a política é a possibilidade de uma intervenção ativa, compartilhada, coletiva, deliberada, em nosso próprio destino. Só na vida pública podemos, de forma conjunta, e como uma comunidade, exercer nossa capacidade humana para “pensar o que fazemos”. Além disso, é razoável, para essa concepção, utilizar o aparato coercitivo do Estado diretamente para o “cultivo” de certas virtudes e o desestímulo de outras. Ou seja, para o republicanismo é aceitável que o Estado se comprometa de forma ativa com certo(s) modelo(s) de excelência humana. Isso se contrapõe ao que geralmente se encontra nas democracias liberais – onde a forma como se organizam a política, a economia, a educação em uma sociedade justa deve ser compatível, em princípio, com a possibilidade de as pessoas adotarem qualquer modelo de virtude pessoal que considerem adequado.

[MÚSICA DESAPARECENDO AO FUNDO]

[CURTA PAUSA SILENCIOSA]

BLOCO 4

[MÚSICA SURGINDO AO FUNDO]

[MÚSICA FICANDO COMO SOM DE FUNDO]

[FRANK]

Ao menos dois tipos de republicanismo podem ser aqui apresentados. O primeiro deles, baseado nas considerações da filósofa Hannah Arendt, trabalha o conceito de liberdade por meio da sua relação com a vida cívica. A ideia é explorar a ligação perdida na história da modernidade entre liberdade e atividade política. Ora: a coincidência, a conexão entre a política e a liberdade deixou se perdeu no modo como hoje experienciamos a política. O resultado? Muitos tendem a acreditar que a liberdade começa onde a política acaba, por exemplo.

O motivo disso, segundo a Arendt, estaria em certa transposição feita pela tradição filosófica sobre o conceito de liberdade: a liberdade passou a fazer parte de um domínio interior, mais relacionado a vontade e aberto à introspecção, ao invés de se manter no domínio da política e dos assuntos humanos em geral. O que a filósofa tinha em mente, portanto, inspirada no Aristóteles, é um republicanismo que acentua, aumenta a relação entre a identidade da vida cívica com a liberdade.

Ou seja: a liberdade do ser humano é aumentada e se encontra na sua participação na vida da cidade, pois para Arendt o homem tem por ambição experimentar a sua liberdade nas suas ações, só pode fazê-lo através da acção política.

O segundo tipo de republicanismo se baseia nas considerações do filósofo Philip Pettit. Ele defende um republicanismo onde a liberdade é o mesmo que não dominação e que promove uma forma de liberdade dos indivíduos que não se reduz as próprias instituições republicanas. O que isso significa? As instituições republicanas, quando tem em mente a liberdade como não dominação, tem o poder intervir nas atividades pessoais das pessoas na medida em que essas atividades são suscetíveis de serem minadas pela dominação.

Agora: a liberdade como não dominação é uma liberdade republicana? Mais ou menos. Pettit parte da sua noção de liberdade a partir de uma variação da liberdade negativa de Isaiah Berlim. O que ele propõe é uma distinção dentro da liberdade negativa, onde existe uma liberdade liberal – a “liberdade como não interferência”- e a liberdade republicana – a “liberdade como não dominação”. No fim, a liberdade mais “liberal” acentua o facto de não sermos incomodados nas nossas ações ou impedidos fisicamente de agir, enquanto a liberdade republicana coloca ênfase na nossa não dominação.

[MÚSICA DESAPARECENDO AO FUNDO]

[CURTA PAUSA SILENCIOSA]

AGRADECIMENTOS

[MÚSICA SURGINDO AO FUNDO]

[MÚSICA FICANDO COMO SOM DE FUNDO]

[FRANK]

Olá olá, pessoaaaaaaal!

Tudo bem com vocês???

Meu nome é Frank Wyllys, sou licenciado em filosofia pela UFAM e também sou o faz tudo desse podcast.

Esse é o quinto episódio da segunda temporada do Esclarecimento onde trato de Filosofia política. Em relação as referências que embasam esse episódio, temos dois capítulos de livros falando diretamente sobre republicanismo: o primeiro está no livro “Manual de filosofia política”, de organização do João Cardoso Rosas, e o segundo está no livro “As teorias da justiça depois de Rawls: um breve manual de filosofia política” e que é de autoria do Roberto Gargarella.

Além disso eu gostaria de agradecer as contribuições financeiras de Fylype Wase, Laira Maressa, Camila Ruzo, Paloma Coelho, Heloisa Mascarenhas, Jéssica Soares e Bismarck Bório. Caso deseje apoiar este podcast, faça uma doação em um valor qualquer ou assine o podcast a partir de 5 reais. Só mandar um Pix para esclarecimentopodcast@gmail.com ou ir no link esclarecimentopodcast.wordpress.com/financie/ para saber mais.

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Isso é tudo por hoje, pessoal.

Até o próximo episódio!

Tchau Tchau!!

[MÚSICA DESAPARECENDO AO FUNDO]

[FIM DO EPISÓDIO]


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